quarta-feira, 6 de agosto de 2014




O MUNICÍPIO DE SANTO AMARO E A REVOLUÇÃO DE 1932

Em 10 de julho de 1932 Santo Amaro comemoraria 100 anos de existência como município.  Uma grande festa havia sido programada para aquela data. Dentre as atrações se destacavam: às 9 da manhã desfile cívico-militar, às 10 missa campal e pela noite, às 20 horas representação da ópera “Rigoletto” de Giuseppe Verdi no Teatro São Francisco por uma companhia lírica.  Durante aquele dia funcionaria ainda, nas dependências do Grupo Escolar da cidade, uma grande exposição-feira.

A prefeitura da cidade, em abril daquele ano, havia conseguido junto ao Governo do Estado 50 contos de réis para a realização dos festejos que deveriam se estender até o dia 25 de julho.

Tudo fazia prever que os festejos chegariam a seu término, em clima de muita animação, chegando a Santo Amaro, nos bondes, ônibus e automóveis milhares de pessoas vindas de todas as partes.

Na noite do dia 9 de julho, em São Paulo, estudantes e membros da Força Pública invadem estações de rádio, de telégrafos e telefônicas dando início à Revolução Constitucionalista de 1932.

Nas primeiras horas da bela manhã ensolarada do dia 10 de julho, chega a Santo Amaro a grande notícia vinda da capital:

“Como uma bomba aqui chegou a notícia tremenda: São Paulo, altivo e forte como sempre, glorioso e intrépido como nunca, esgotados os meios brandos, cansado de pedir com humildade a volta do país ao regime legal, levantara-se, e de armas em punho exigia a Constituição! Era a guerra sem trégua pelo direito e pela justiça, competindo a cada paulista digno desse nome o abandono de tudo, sendo trocado o conforto dos lares pelas agruras das trincheiras em que tremulava o lábaro sacrossanto, listado de negro e branco!” 1

O santamarense se viu então obrigado a esquecer dos festejos de sua cidade, suspendendo-os, para imediatamente trocar o smoking pela farda cáqui do Exército Constitucionalista.

Na manhã do dia 10, oradores discursavam da sacada da Câmara Municipal esclarecendo à população os acontecimentos que haviam ocorrido na capital no dia anterior e a situação do Estado que se via envolvido na maior guerra civil de sua história. As pessoas acompanhavam atentamente as palavras e em uníssono davam vivas a São Paulo.

A comissão responsável pelos festejos reúne-se com o prefeito e membros do legislativo municipal na Câmara. Decidem partir, em automóveis, para São Paulo, ao Palácio dos Campos Elísios (sede do Governo do Estado) a fim de prestar apoio ao Governador naquilo que seja necessário ao movimento revolucionário.  Lá são recebidos por Pedro de Toledo que os direciona ao Coronel Euclydes Figueiredo, comandante operacional das forças constitucionalistas. O militar indaga a um membro da comissão o que queriam e este responde de forma convicta: Armas e munição! O Coronel pensa por um momento e em seguida declara: “Está organizada a Companhia do Exército Isolado de Santo Amaro”. Primeiro contingente constituído na Revolução de 32. A Companhia passaria a ser conhecida pela sigla CIESA e chegaria a contar com 300 homens.

                                             
                                               Coronel Euclydes Figueiredo (à esquerda) 


 Voluntários de Santo Amaro ao lado do prédio da prefeitura do municipal

              
Toda a comissão de festejos do centenário passa a integrar a Companhia. O secretário da comissão, o tenente2 Luiz Matos de Araújo assume o comando ficando no sub comando o tenente Moupyr Monteiro. Os demais integrantes da comissão ocupam outras funções na Companhia como médicos, capelão, engenheiros, sargentos e soldados, todos de Santo Amaro, sem exceção.


Soldados em instrução
                         
                                                           
CIESA em marcha pelas ruas de Santo Amaro


Soldados na Avenida Adolfo Pinheiro

A CIESA, por ordem do Coronel Euclydes, dirige-se então à cidade de Santos (após rápido estágio na serra de Cubatão), onde deveriam se apresentar ao comandante do Exército Constitucionalista naquela cidade, o Coronel  Mello Matos. Este determina que ocupem  a divisa com o Paraná, no litoral.



A CIESA ocupa a linha que vai de Cananéia à Xiririca (hoje Eldorado Paulista) entrando nesta última cidade após desalojar o inimigo que aí se colocara em perseguição às forças dos batalhões constitucionalistas “Barbosa e Silva” e “Marcílio Franco” que haviam recuado a partir do setor de Apiaí.

Após renhidos combates a CIESA não só expulsa os inimigos da cidade como também captura várias metralhadoras deixadas por eles durante a fuga. O comando da Companhia decide avançar Paraná adentro tomando a cidade de Porto da Linha, na baía de Paranaguá, importante trevo radio-telefônico. Durante os 15 dias que se seguiram é a única força paulista sediada em território inimigo.

Por ser muito extensa a linha de combate, a CIESA se retira para Cananéia que é retomada pelo inimigo em poucos dias. Os soldados santamarense reagem e uma patrulha de apenas 30 homens retoma a cidade após duro combate no qual são feitos 16 prisioneiros do exercito inimigo. Passam a guarnecer a cidade apenas 5 soldados as CIESA armados de uma metralhadora pesada. Essa pequena guarnição evita uma invasão do inimigo em canoas obrigando-os a se renderem e a entregarem suas armas. Mais 80 soldados inimigos são feitos prisioneiros. Este foi sem dúvida um dos mais brilhantes feitos da CIESA e de toda a Revolução de 1932.

A CIESA então se divide em dois pelotões: um reforça o contingente de Cananéia e o outro se dirige aos combates em Itapitangui ao norte. O pelotão que guarnece Cananéia é duramente atacado por um contingente inimigo cinquenta vezes maior. O comandante da tropa inimiga exige que o comandante da CIESA se renda com seus homens. Este convida o comandante inimigo a vir buscar as armas de seus soldados...

A CIESA ainda auxiliaria a Força Pública de São Paulo na liberação de Xiririca que se encontrava cercada pelo inimigo. O contingente é dividido em duas colunas: uma deveria seguir pela estrada Jacupiranga-Xiririca e a outra deveria subir o Rio Ribeira em barcos.

No dia seguinte a CIESA rompe o cerco e pela segunda vez toma Xiririca. Nesta batalha morre o soldado voluntário santamarense Delmiro Sampaio, única baixa da Companhia durante toda a campanha.

Ao final da Revolução a CIESA havia sofrido apenas essa baixa e tinha ainda mais 18 feridos. O corpo médico da Companhia fez excelente trabalho fundando na área da atuação da CIESA 5 hospitais de emergência  e um hospital central em Pariquera-Açú. Como medida preventiva, fazia o corpo médico que todos os integrantes da CIESA tomassem diariamente um comprimido de quinina (medicamento com funções antitérmicas, antimaláricas e analgésicas).

Ao final da campanha, com todo o setor sul tomado pelos inimigos sulistas, a Companhia recebe ordens de voltar a Santos e ajudar no policiamento de cidade que era palco de uma grande greve de estivadores.

Em 12 de outubro, já cessadas as hostilidades entre revolucionários e legalistas, a CIESA desfila na cidade de São Paulo indo da Estação da Luz à Praça da Sé sob aplausos da população paulistana.




1  Caldeira, João Netto. “Álbum de Santo Amaro: A História dos Santamarenses”, 1935, pág. 93.

2  Comissionado posteriormente no posto de Capitão.

BIBLIOGRAFIA

CALDEIRA, João Netto. “Álbum de Santo Amaro: A História dos Santamarenses”. Ed. Bentivegna e Netto, 1935
BERARDI, Maria Helena Petrillo. "História dos Bairro de São Paulo: Santo Amaro". Ed. Prefeitura de São Paulo, 1969

FOTOS

http://tudoporsaopaulo1932.blogspot.com.br/2014/07/a-epopea-de-piratininga.html
http://tudoporsaopaulo1932.blogspot.com.br/2013/03/imagens-da-revolucao.html
Projeto "A fotografia como concepção histórica" do Prof. Carlos Fatorelli
CETRASA - Centro das Tradições de Santo Amaro

Nenhum comentário:

Postar um comentário