A
PENSÃO ESPECIAL DOS VETERANOS DA REVOLUÇÃO DE 1932
O primeiro normativo a
tratar de benefícios a serem concedidos aos participantes da Revolução de 1932
foi o artigo 30 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da
Constituição Estadual de 1947. Este artigo previa alguns direitos aos veteranos,
mediante a edição de lei regulamentadora, como preferência em concursos
públicos, estabilidade, promoções , isenções de impostos, subvenções estatais
às associações de veteranos, etc.
A Lei Estadual 211/1948
regulamentou algumas das vantagens criadas no art. 30 do ADCT da CE/1947. O
art. 1º da Lei 211 definiu quem seriam os veteranos aptos a se beneficiarem dos
direitos criados pela CE/1947, in verbis:
Artigo 1.º - Por participantes ativos da Revolução
Constitucionalista de 1932 devem entender-se:
I - os voluntários enquadrados em quaisquer unidades ou serviços de
guerra criados na vigência do Movimento
II - os soldados, inferiores e oficiais que compunham
unidades do Exercito, da Fôrça Pública e da Guarda Civil e que, então, foram
mobilizados e prestaram serviços determinados pelos respectivos comandos;
III - os civis que prestaram Serviços de retaguarda, tais como de
instrução, mobilização e abastecimento de tropas em operações; de propaganda ou
direção do movimento revolucionário; de policiamento de cidades e outros
serviços a cargo de organizações então fundadas.
Parágrafo único - Essa participação deverá ser
satisfatoriamente comprovada e não será reconhecida quando tenha havido
capitulação propositada, deserção, condenado por crime praticado, adesão ao
inimigo, ou recusa de prestar serviços durante a incorporação, ou ainda, quando
durante ou depois dela haja o interessado praticado atos, ou tornado atitudes
incompatíveis com a sua adesão ao Movimento.
A primeira pensão paga a veteranos
da Revolução de 32 veio apenas em 1952. Era exclusiva para aqueles civis que,
durante o movimento revolucionário e em decorrência deste, haviam ficado
mutilados (Lei Estadual 1680/1952). Os beneficiários eram um grupo pequeno e
durante décadas receberam como pensão o soldo de 3º sargento da Força Pública.
Tratava-se de benefício assistencial intransferível ao cônjuge sobrevivente ou
a outros dependentes. Em 1986 (Lei Estadual 5.417), já quase sem beneficiários,
teve seu valor unificado à pensão especial criada na década anterior.
Em 18 de dezembro de 1978
foi promulgada pelo governador Paulo Egydio Martins a Lei Estadual 1.890 que
autorizava o Poder Executivo a conceder pensão especial mensal, vitalícia e
intransferível a participantes civis da Revolução Constitucionalista de 1932,
nos termos dos incisos I e III do artigo 1º da Lei 211/1948 supra transcrito.
Um mês depois, em janeiro de
1979, a Lei 1.890/78 foi regulamentada pelo Decreto Estadual 13.146:
Artigo 1.º - Na aplicação da Lei n. 1.890, de 18 de dezembro de 1978 que autoriza o
Poder Executivo a conceder pensão mensal, vitalícia e intransferível , a
participantes civis da Revolução Constitucionalista de 1932, observar-se-ão as
normas estabelecidas neste decreto
Artigo 2 º - Entendem-se por participantes civis da Revolução Constitucionalista de
1932, nos termos dos incisos I e III do Artigo 1.º da Lei n. 211, de 7 de
dezembro de 1948:
I - os
voluntários enquadrados em quaisquer unidades ou serviços de guerra criados na
vigência do Movimento;
II - os
Civis que prestaram serviços de retaguarda, tais como instrução, mobilização e
abastecimento de tropas em operações de propaganda ou direção do movimento
revolucionário de policiamento de cidades e outros serviços a cargo de
organizações então fundadas
Parágrafo único - Não fazem jus à pensão os participantes da Revolução Constitucionalista
que, a qualquer título, venham percebendo pensão do Estado e os que se
enquadrem nas hipóteses a que se refere o parágrafo único do Artigo 1.º da Lei
n. 211, de 7 de dezembro de 1948.
Artigo 3.º - Os interessados solicitarão o benefício da Lei n. 1.890, de 18 de
dezembro de 1978, em requerimento dirigido ao Governador e protocolado
na Secretaria da Promoção Social, feita a prova de participação no Movimento
Constitucionalista nos termos do Artigo 2.º deste decreto (grifos nossos).
Artigo 4.º - Caberá a Secretaria da Promoção Social proceder a instrução do
respectivo processo mediante a verificação, em cada caso, do cabimento da
concessão do benefício e a existência de obrigações legais de terceiros para
com os beneficiários.
Parágrafo único - Concluída a instrução, será o processo submetido ao Governador com
proposta fundamentada do Secretário da Promoção Social.
Artigo 5 º - A pensão terá vigência a partir da publicação do despacho de
deferimento no órgão oficial.
Artigo 6 º - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação.
Palácio dos Bandeirantes, 16 de janeiro de 1979.
PAULO EGYDIO MARTINS
Começava
aí verdadeira via crucis a ser
percorrida pelos veteranos da Revolução Constitucionalista, àquela época,
sexagenários e septuagenários em sua maioria.
Vejamos
trecho de carta do veterano Francisco Geminiani publicada no jornal Folha de
São Paulo em 24/04/1980:
“Eis que protocolei em 5 de março de 1979 (há mais
de um ano) pedido nesse sentido, e até hoje não mereci aquele despacho, apesar
de fartamente documentada minha participação na Revolução. Considerando minha
idade, cerca de setenta anos, creio que se esse retardamento continuar, não
mais me será possível receber aquela pensão, a qual propiciaria uma sensível
melhora no meu padrão de vida, o mesmo ocorrendo com tantos outros que se
encontram nas mesmas condições.”
Apenas
em 6 de julho de 1979 (Decreto 13.670/79) é criada uma Comissão Especial a quem
competia: fixar diretrizes para o cumprimento da Lei 1.890, processar os
pedidos de pensão e apresentar relatório fundamentado propondo o deferimento ou
o indeferimento do pedido de pensão.
A
antiga sede da Sociedade Veteranos de 32 – MMDC, na Rua Anita Garibaldi, chegou
a receber, durante o ano de 1979, mais de cem pessoas por dia buscando
informações sobre como requerer o benefício.
Porém muitos
não tinham como comprovar sua participação na Revolução. Para provar que
participou da Revolução Constitucionalista o veterano podia apresentar um
documento da época como jornais nos quais aparecesse seu nome, fotografias,
antigos livros de registro de prefeituras, correspondências com familiares
durante a campanha e até mesmo a citação de seu nome em livros sobre a
Revolução de 32. Em último caso, o veterano podia ainda tentar provar a sua
participação por meio de depoimentos de testemunhas idôneas. Contudo, depois de
quase 50 anos, era difícil para muitos deles obterem essas provas e muitas
vezes suas testemunhas “idôneas” já estavam mortas (seus comandantes militares,
por exemplo). Dessa forma, milhares de veteranos não tiveram sequer como instruir
seus pedido de pensão.
Os
trabalhos da Comissão Especial davam-se de forma muito lenta. A fim de evitar
fraudes e injustiças, as análises dos pedidos de pensão davam-se caso a caso. Especulava-se que o Estado se demorava
propositadamente em processar os pedidos de pensão enquanto iam falecendo os
veteranos e assim diminuía sua despesa.
Segue
abaixo trecho de carta enviada pelo veterano Gil Franco à Folha de São Paulo e
publicada naquele periódico em 07/09/1980:
“Agora, aos 77 anos de idade, aguardo, sem
esperanças, o célebre decreto do governador do Estado que manda pagar, aos que
serviram São Paulo, pensão que será ordenada quando a maioria dos merecedores
dela já estiverem mortos. Então uma medalha será entregue à família do
morto-herói, como lembrança de sua luta pelo bem-estar do Brasil. Mas antes que
eu morra, quero agradecer ao governador do Estado a cunhagem da medalha...”
A Comissão,
que só foi formada depois de mais de 3 meses de sua criação, chegou a
investigar a condição sócio-econômica do veterano e a indeferir,
preliminarmente, a pensão aos veteranos de classe social mais elevada.
Entretanto, nem a lei de criação da pensão, nem seu decreto regulamentador
impunham, para a concessão do benefício, ser o veterano pobre. Uma série de
ações judiciais foram propostas contra o Estado para compeli-lo ao pagamento do
benefício segundo os exatos critérios estabelecidos na Lei 1.890/78 e no
Decreto 13.146/79.
Durante
o desfile de 9 de julho de 1980, quando já mais de 12 mil pedidos de pensão
aguardavam deferimento, os veteranos, após marcharem de fronte ao Obelisco no
tradicional desfile, fizeram um protesto em frente ao palanque das autoridades
pedindo agilidade na apreciação dos pedidos. O protesto, no qual não faltaram
palavras de ordem contra o governador e pela celeridade na concessão das pensões, teve de ser contido pela polícia que
retirou os veteranos do local (Folha de São Paulo de 10/09/1980).
Apenas
em 25/05/1981 foram concluídos os 103 primeiros pedidos de pensão. Naquela
data, com toda pompa e circunstância, em cerimônia no Palácio do Governo, o
então governador Paulo Maluf promulgou o decreto que autorizava o pagamento da
pensão aos 103 primeiros veteranos.
Em 1983 a Lei 1.890/78
foi alterada pela Lei 3.988, o que tornou possível a transferência da pensão à
viúva do veterano:
"Artigo 1º - É Poder Executivo autorizado a conceder, nos termos
desta lei, pensão mensal, vitalícia e intransferível, exceto à viuva do
beneficiário, a participantes civis da Revolução Constitucionalista de
1932, nos termos dos incisos I e III do artigo 1º da Lei
n. 211, de 7 de dezembro de 1948, de valor correspondente ao do padrão "1-A" da Tabela II, da
escala de vencimentos do funcionalismo público civil do Estado"(grifo
nosso) .
A vigente
Constituição Estadual de 1989 inovou e passou a prever a transferência da
pensão não só à viúva mas também à companheira e a outros dependentes do
veterano falecido:
Artigo 57 - Aos participantes ativos da Revolução
Constitucionalista de 1932 serão assegurados os seguintes direitos:
I - pensão
especial, sendo inacumulável com quaisquer rendimentos recebidos dos cofres
públicos, exceto os benefícios previdenciários, ressalvado o direito de opção;
II - em caso de morte, pensão
à viúva, companheira ou dependente,
na forma do inciso anterior (grifos nossos).
Parágrafo
único - A
concessão da pensão especial a que se refere o inciso I, substitui, para todos
os efeitos legais, qualquer outra pensão já concedida aos ex-combatentes.
Ao longo das
décadas de 80 e 90, mais de 15 mil pedidos de pensão especial da Revolução
Constitucionalista de 1932 foram deferidos pelo Estado.
Hoje, aproximadamente
1.500 pensões especiais continuam ativas junto à Secretaria de Gestão Pública
do Governo do Estado de São Paulo. Na sua imensa maioria, as beneficiárias são
viúvas de veteranos. Há ainda algumas veteranas (serviços de retaguarda), alguns casos de filhas
solteiras de veteranos falecidos até dezembro de 1992 (Lei Complementar 698/92)
e de filhos (ambos os sexos) inválidos ou incapazes e que nessas condições já
se encontravam quando do falecimento do veterano (Lei Complementar 180/1978,
art. 147, III).
O último
reajuste do valor da pensão especial ocorreu em setembro de 2012. A assombrosa
quantia de R$ 720 premia hoje aqueles que há mais de 80 anos lutaram por
democracia e liberdade sob o manto das treze listas.
REFERÊNCIAS
Acessos em
31/08/2016